domingo, 15 de junho de 2008

Fichamento de Texto: MILMAN, Luis. “Negacionismo: gênese e desenvolvimento do genocídio conceitual” In.: MILMAN, Luis, VIZENTINI, Paulo.

I. Introdução: Atrocidade e Cinismo:
O artigo de Luis Milman foca o trabalho dos negacionistas, a vertente de historiadores que nega os crimes nazistas, desmentindo-os, simplificando-os, ou tratando os como meros atos de guerra e até mesmo defensivos pelos nazistas. Eles constroem uma versão fictícia da História e que essa versão produz efeitos políticos, vide a extrema direita européia e o avivamento do anti-semitismo. Com isso, obriga os historiadores a refutá-los e a fazer uma reflexão sobre a relevância do papel da História e da memória para a educação humanista.
Essa pessoas que negam ter havido o extermínio planificado de judeus (sobretudo, mas não exclusivamente), desejam, através de contorcionismos retóricos, descriminalizar o regime nazista e, com isso, reabilitar o nazifascismo como opção política. É essa tentativa, a saber, a de aliviar o nazismo de seu fardo criminoso, que deve ser analisada.
Como historiografia, o negacionismo é uma deformação, uma expressão particularmente assustadora da naturalidade, baseados num perspectivismo relativista, Eles praticam o embuste e o cinismo. Alguns, por exemplo, admitem que judeus foram assassinados pelos alemães, mas dizem que estes assassinatos teriam sido crimes de guerra, tão condenáveis quanto os crimes cometidos pelos aliados contra os alemães.
Com essas declarações, admitem uma indiferença moral com respeito a atrocidades cometidas contra judeus pêlos alemães durante a II Guerra. Não há remorso, não há admissibilidade de culpa, reconhecimento ou vergonha pelo sofrimento humano causado. Há racionalizações sobre as circunstâncias da guerra.
No entanto, o trabalho de renomados historiadores como Zygmund Bauman, nos mostra exatamente a face real e cruel desses atos de guerra nazistas. “O Holocausto foi um genocídio deliberado e planificado, cujo resultado foi à eliminação da metade da população judaica européia. Também é verdade que a doutrina e a prática da eliminação física dos judeus, priorizada e executada em escala industrial pêlos nazistas, é, para os padrões de uma moral não contaminada pelo cinismo, uma aberração sem precedentes na História. Ela resultou da combinação de uma idéia política bizarra - a reforma do mundo pela engenharia racial, que era a convicção de um grupo racista que conseguiu chegar ao poder na Alemanha com uma conjunção peculiar de características do totalitarismo nazista, tais como a formação de uma cadeia de comando disciplinada e disposta a executar as ordens de um líder "acima de todas as outras devoções e compromissos, a indiferença de pessoas comuns com relação ao destino dos judeus, o emprego de tecnologia e de métodos de planejamento modernos e a criação de uma máquina administrativa dedicada ao assassinato coletivo”.
O maior perigo desse movimento é que os pseudo-argumentos dos revisionistas da negação e do seu papel na ofensiva política da ultra-direita européia, voltou a ocupar terreno em disputas eleitorais.

II. Dos Paleonazistas a Rassinier: a primeira fase do negacionismo:
Os negacionistas apresentam-se como pesquisadores dedicados a questionar a "história oficial". No entanto essas dissimulações têm suas motivações políticas. É a expressão, a mais recente, do ideário político anti-semita cultivado pela direita radical européia desde o final do século passado; é o instrumento, não o único obviamente, de uma intensa ofensiva ideológica que visa a habilitar o fascismo como alternativa política para a solução de problemas estruturais das democracias consideradas estáveis na Europa do Pós-Guerra; é uma compreensão inteiramente anti-sionista do conflito árabe israelense e, sobretudo, palestino-israelense. Desse modo, o negacionismo passa a servir de justificativa para a rejeição de qualquer forma de compromisso com a existência política de Israel, rejeição a qual se apegam setores árabes e muçulmanos ideologicamente intransigentes.
Componente principal ainda é o anti-semitismo virulento, que identifica as oligarquias capitalistas ao judaísmo internacional, e este ao sionismo. Destaque para aqueles que se utilizam da complicada geopolítica do Oriente Médio e as ações de Israel pra simplificar os crimes cometidos pelos judeus. Os Paleonazistas acrescentaram, ao pan-arabismo e ao enfrentamento com Israel, o componente anti-semita do ideado nazista, que se tomou, assim e definitivamente, um ponto importante da doutrina de rejeição total de Israel no mundo árabe e, a partir de 1980 especialmente, no Irã.
O negacionismo passa, a partir dos anos 70, a ser o elemento central de uma estratégia que se destina a criar condições para a recomposição ideológica de grupos políticos nazistas. Inicialmente centrados na acusação de parcialidade e revanchismo dos julgamentos de Nuremberg, essa ensaística deriva para a eliminação dos crimes nazistas e para a inversão que transformava os criminosos da II Guerra em vítimas, apresentando teses como a da inexistência das câmaras de gás.
Nesse cenário destaque para os grupos europeus, como o Movimento Social Europeu, que reagrupam ideólogos da extrema-direita e amantes do fascismo com a participação de autores negacionsitas como Bardeche e Rassinier.

III. De Faurisson e da Velha Toupeira: o negacionismo híbrido:
Essa escola alega que a “história oficial” compreende uma só mentira, desafortunadamente endossada até agora pela história oficial (a dos vencedores) e pelo poder colossal dos meios de comunicação. Que o genocídio era "uma invenção judia pura e simples" e que "a única coisa exterminada em Auschwitz foram piolhos". Nesse cenário, destaque para o papel da França de Vichy e do nostálgico anti-semitismo do vichysmo francês para o negacionismo e como o berço dos debates revisionistas.
No entanto, essa vertente tem tido o apoio de setores da esquerda anárquica, radicalmente anti-sionistas, o esquerdismo sectário que passava por um processo de quase extinção no final dos anos 70, mas que encontrou, na negação do genocídio, a base do que pode ser chamado seu renascimento ideológico. Isso tudo quebrou a monotonia da identificação do negacionismo como discurso exclusivo de extrema direita e, gerou uma confusão acerca da natureza desse movimento. A esquerda radical passou a defender posições nacional-socialistas e anti-sionistas, numa ruptura total com o consenso antifascista, do qual a esquerda européia historicamente participara. Não podemos perder de vista, entretanto, que o lugar natural da negação do Holocausto é a extrema-direita.
Destaca-se nesse mundo do faz de conta, a Velha Toupeira como editora anti-sionista e negacionista que virara um grupo revolucionário independente da ultra-esquerda que abrigava os revisionistas. Nela os ideólogos como Rassinier têm a liberdade de publicarem suas deslavadas mentiras. Anti-soviética, anti-burguesa, por fim anti-trotskista, anti-sionista e intérprete autêntica da história revolucionária. Vendo o anti-fascismo como álibi do capitalismo, para ela, não há qualquer especificidade hitlerista nas galerias das tiranias modernas: os campos de concentração só poderiam ser campos de exploração no sentido econômico do termo.
É também importante acentuar que, desde a primeira metade dos anos 70, tais idéias passaram a ser defendidas por nazistas europeus e norte-americanos, que publicaram vários textos destinados a provar que o extermínio de judeus não passava de um mito. Nessa época também, alimentada pelo apoio e a dimensão obtida pelas teses, à extrema-direita francesa voltaria a apresentar credenciais políticas, com a Frente Nacional de Lê Pen.

IV. Butz, Irving e Garaudy:
David Irving na década de 70, com a publicação do livro "A Guerra de Hitler", tentou isentar Hitler de qualquer responsabilidade pelo extermínio, que o autor atribui principalmente a Heydrich e a Himmler. Irving sustentava, nesse livro, que matanças em massa haviam sido cometidas desordenadamente e obedecido a uma dinâmica independente, inteiramente desconhecida de Hitler, que não as teria aprovado.
Surgiu no fim da década de 80, o Leuchter Report um relatório pretensamente científico de autoria de um engenheiro que se dizia especialista em instalações de câmaras de gás para sentenciados à morte dos Estados Unidos. Destinava-se a provar que os instrumentos usados em Auschwitz, Treblinka e Sobibor não eram adequados para a aniquilação em massa, e que sua função era a desinfecção sanitária.
Vale ressaltar as conclusões dos trinta anos de pesquisa dos autores revisionistas: As "câmaras de gás" de Hitler nunca existiram; os "genocídios ou os pretensos genocídios” dos judeus nunca ocorreram; claramente, Hitler jamais ordenou ou permitiu que alguém fosse morto por razões raciais ou religiosas; as alegadas "câmaras de gás" e o alegado "genocídio" são uma única e a mesma mentira; essa mentira, essencialmente de origem sionista, permitiu uma gigantesca fraude político-financeira cujo principal beneficiário é o Estado de Israel; as principais vítimas dessa mentira e fraude são os alemães e os palestinos; o tremendo poder da mídia tem garantido, até agora, o sucesso da mentira e proibido a liberdade de expressão daqueles que denunciam a mentira, e que os apoiadores da mentira agora sabem que ela agora está para ser desvelada; eles distorcem o significado e a natureza da pesquisa revisionista; eles chamam de "ressurgimento do nazismo" ou de "falsificação da história".
Todos esses argumentos não passam de uma simulação ideológica ampliadas na identificação das causas do sofrimento do povo palestino com as causas do sofrimento do povo alemão, ambos alegadamente vitimados pela tirania judaica, além da denúncia da perseguição que sofre a pretensa pesquisa histórica.
As premissas tomam Hitler inocente ou ao menos atenuam seus crimes. Suas conclusões são credenciadas na linha terceiro-mundista da escola, ao fixarem uma posição anti-imperialista, cuja essência é, no entanto, é uma propaganda anti-sionista que encobre o conhecido anti-semitismo político.

V. Negacionismo como retorno à catequese racial:
Essa vertente extrai tais teses do que seus protagonistas chamam de "crítica de documentos". A crítica, alegam, produz uma ruptura com o que, ainda segundo a escola, tornou-se a "opinião de consenso" acerca do destino dos judeus europeus durante a II Guerra. No entanto trata-se de tentar desmentir um fato “indesmentível”, pois além de tudo, a literatura revisionista não atende a critérios histórico-documentais sequer aceitáveis.
Trata-se da invenção de um nazismo historicamente inocente e, por outro, na denúncia de Israel como um estado títere do imperialismo - que é apresentado como uma ordem política e econômica, em última instância, controlada por judeus.
Uma interpretação anti-semita sistemática da história (que invalida qualquer evidência do extermínio) e a constante exploração da “judeofobia”, que identifica o judaísmo com uma corporação político-econômica voltada para a dominação dos povos, tomando-se a essência da visão de mundo e da prática nazista com uma receptividade deste anti-semitismo renovado, a partir da década de 50, pela propaganda de guerra do mundo árabe contra Israel,
O anti-semitismo fornece, em síntese, a base conceitual da escola negacionista. Com a combinação de variadas de ideologias, o que fazem é atualizar, no Pós-Guerra, o mito da perversidade judaica, complementado-o com o disfarce da solidariedade terceiro-mundista. Demonstram uma submissão de tipo confessional ao linguajar da burocracia nacional-socialista, que se destinava a encobrir o assassinato. Tais grupos valem-se da negação do extermínio para sustentar que o regime nazista (anti-imperialista, pacífico, e anticomunista, para os nazifascistas, ou mera decorrência do capitalismo, para os errático-marxistas) foi levado à guerra por um complô judaico, cujos interesses Hitler e seu regime haviam contrariado.
Faz-se a suspeição sistemática lançada contra toda a evidência do Holocausto. Testemunhos dos sobreviventes, documentos e fatos incontroversos sobre a sua planificação ou execução são simplesmente denunciados como invenções do sionismo internacional e dos governos que ele supostamente controla.
Promovendo um redirecionamento da literatura marxiana para o anti-semitismo fora do contexto do autor, é a compreensão que as mitologias anti-semitas suprimem quando propõem uma interpretação literal e atomizada deste texto, provocando a degeneração do pensamento de esquerda.
A crença de que o judaísmo é o arquétipo do capitalismo está presente em muitos textos do século XIX e ocupa um lugar central no enredo que faz da negação do genocídio a pedra-de-toque de teorias conspiratórias e fantasias de complôs secretos. É com base no uso dessa crença que a pseudo-história dos negacionistas manipula evidências e questiona a existência de um crime que ninguém pode seriamente pretender negar. Na realidade, o negacionismo só funciona, na História, em vista da operacionalidade do mito anti-semita. No negacionismo, o crime é simplesmente suprimido, transformado em ficção e, nessa condição, atribuído a um plano de dominação judaica.

VI. A título de conclusão: metodologia ou patologia:
O investimento simultâneo na humanização de Hitler (e de seu regime) e na satanização dos judeus sustenta uma indústria editorial de milhões de livros e ainda ajuda a conquistar votos em toda a Europa (cerca de 20 por cento do eleitorado). No entanto, devemos nos ater a questionar em que sentido pode ser sustentado a tese de que a derrota do nazismo foi à derrota da Alemanha?
Os negacionistas colocam-se deliberadamente à margem da seriedade científica, mas isto não cria maiores dificuldades para suas pretensões. Há, na mentalidade contemporânea, espaço suficiente para crenças em fantasmagorias e insanidades e isto nada tem a ver com o fato de haver uma verdade suficientemente assentada sobre o destino de milhões de judeus europeus: eles foram exterminados de várias formas, por uma decisão política clara e uma máquina criada para o assassinato em massa. Os negadores desta verdade não oferecem nenhum argumento sério, não formulam nenhuma dúvida fundamentada, sobre o que já sabemos sobre os crimes nazistas.
Tem um pouco mais de espaço, pois as referências explícitas, os comandos e as decisões ligadas ao extermínio foram sistematicamente evitadas, assim como foram destruídas muitas evidências dos crimes, que foram recobertos pela linguagem cifrada.
No entanto, eles fazem um jogo de persuasão, para o qual importa apenas a simulação da verdade, apenas a aparência de ciência e de crítica produzida por uma logorréia voltada para a sedução de ignorantes e protofascistas.
O racismo moderno, que nasceu no século XIX também com uma aparência de cientificidade, é, sem dúvida, um conjunto hermético de idéias inteiramente mentirosas e desumanas. O racismo - e o anti-semitismo em particular- toma tudo àquilo que é falso sobre a natureza humana, a base para a construção de certezas indestrutíveis ao nível da história e da economia. Sua noção central, a raça, é a negação de todas as idéias de utopia, a melhor expressão do ressentimento e do desejo político pela imobilidade social, do horror reacionário à mudança e à transformação
O racismo, em qualquer nível, é a negação do humanismo. É uma ideologia da reação, A degeneração na própria constituição natural dos indivíduos, que assim são agrupados em campos de pureza ou impureza biológica. O racismo faz a fusão entre História e Biologia, entre moral e natureza. Estritamente, o racismo não responde à razão, porque não é um argumento, mas uma patologia racionalizada.
Agrupamentos e partidos políticos xenófobos da atualidade substituíram a forma biológica desta patologia pela forma culturalista. A preservação da "pureza racial" deu lugar à defesa da "identidade cultural autêntica".
O racismo e o integrismo cultural supõem uma comunidade de sangue ou de cultura monolíticas e condicionam a identidade pessoal pela absolutização das diferenças. Essa ideologia proíbe qualquer raciocínio que não seja derivado do medo da mestiçagem, do ódio aos inimigos da raça ou da tradição. Os ideólogos neonazistas, no entanto, dedicam-se a reorganizar o mito da conspiração judaica mundial em vista de objetivos políticos renovados. Eles são racistas, em sua grande maioria. Há também os “judeófobos”. Alguns têm ainda defendido a posição de ignorá-la, mas esta me parece uma forma equivocada de avaliar o problema do negacionismo. Confrontá-la com razões e posicionamentos claros é um passo efetivo no sentido de fazê-la refluir. Devemos isso à memória dos que foram mortos em Auschwitz, Beizec, Treblinka, Sobibor, Majdanek, Chelmno, às vítimas da eutanásia, das torturas, dos trabalhos forçados, dos fuzilamentos, do confinamento em guetos, dos que resistiram e dos que enfrentaram o nazismo. Devemos, sobretudo, a nós mesmos e ao nosso futuro como civilização.

Fichamento de Texto: GOODRICK-CLARKE, Nicholas. Sol Negro: cultos arianos, nazismo esotérico e políticas de identidade. São Paulo: Madras, 2004.

Na década de 50, o neonazismo começou a tomar forma. Como movimento típico de países centrais, ele fora motivado nos Estados Unidos pela oposição branca aos direitos civis para negro e uma maior integração dessa fração da população na sociedade em geral, como por exemplo, o uso de um transporte integrado independente da cor do usuário. Na Grã-Bretanha os grupos neonazistas surgiram em resposta aos crescentes níveis de imigração de pessoas de cor a partir do final dessa década. À medida que os negros americanos começaram a se beneficiar da legislação dos direitos civis e os imigrantes passaram a estabelecer-se politicamente na Grã-Bretanha na década de 80, os grupos neonazistas sugeriram que o domínio racial branco estaria ameaçado.
Como identifica o autor, essa extrema-direita racial que logo chegaria à política com resultados eleitorais expoentes, não cresceu a partir exclusivamente desse sentimento de ameaça pela etnia branca. A partir da década de 60, os grupos de poder negro e críticos radicais exigiram o reconhecimento oficial do negro como minoritário, demandando assim uma ação compensatória por parte do Estado. A institucionalização dessas exigências levou a vastos programas de oportunidades iguais e ação afirmativa na provisão de serviços públicos, empregos e educação para favorecer negros americanos e programas de quotas raciais. Os efeitos discriminatórios dessas políticas sobre os brancos causaram certo ressentimento por parte desses e a concessão de privilégios baseados na raça estimulou o crescimento da extrema direita racista.
Partindo para outro campo de discussão, o autor analisa os cultos arianos e o nazismo esotéricos como mitologias para negar o declínio do poder branco no mundo, em virtude da ascensão de grupos raciais inferiores (negros, judeus, latinos e muçulmanos). Apoiados em promessas milenaristas e filosóficas, acreditam que as raças européias, brancas, estão temporariamente incapacitadas pelas tais influencias estrangeiras, de exercer o domínio branco sobre o mundo.
Surgem então duas vertentes de neonazistas. Uma primeira, mais antiga, na qual tem George Rockwell como expoente, segue modelos nazistas e uma narrativa épica da Segunda Guerra Mundial para se opor ao liberalismo do pós-guerra, com os judeus como seus principais arquitetos, e aos negros como a continuidade de antigos e intermináveis conflitos. No entanto, uma nova vertente vem ganhando espaço com um discurso de afirmação da identidade branca – ou reafirmação – mas apoiadas num novo nacionalismo como uma cultura de resistência às forças da globalização e de imigração. Desse modo o culto ariano de identidade branca é mais presente nos Estados Unidos, onde os desafios do multiculturalismo e da imigração terceiro-mundista são maiores.
O problema da imigração americana e suas negativas conseqüências já eram previstas desde o fim da I Grande Guerra, e atualmente o inevitável eclipse do mundo ocidental branco é um problema mais grave, uma vez que a falta de controle dessas ondas migratórias provoca a majoritariedade de imigrantes ilegais.
Uma vez migrados - sejam para os Estados Unidos com suas exceções quanto aos negros, ou para a Grã-Bretanha, como o melhor exemplo europeu - esquecendo-se o modo de como o fizeram, o problema maior passa a ser a assimilação desses no país. Isso requer uma política de bilingüismo e multiculturalismo no sistema educacional e no cotidiano em geral. Benefícios institucionais antes restritos aos negros expandem-se aos imigrantes, colocando lado a lado negros e brancos. Os direitos humanos internacionais sobre noções de soberania nacional também levou a uma erosão da cidadania, pela qual os estrangeiros clandestinos recebem benefícios do bem-estar social, educação e subsídios do governo. O processo de miscelânea cultural, ou aculturação ocidental, aumenta o embate. Longe de terminar, ainda têm os legalizados, acusados de sobrecarregar os sistemas de saúde, educação e previdências, são também vistos como responsáveis pelo desemprego dos nativos. Os domiciliados por sua vez, não vêem os ilegais com bons olhos.
Disso resulta uma situação curiosa. O multiculturalismo é promovido por agendas políticas liberais e de esquerda, na busca pelo apoio das cada vez mais numerosas minorias, ao lado, da renovação do vigor da extrema direita a partir da década de 80. Esse último aspecto deve-se a uma nova geração de neonazistas, acomodada em grupos racistas de skindheads e através de elementos culturais como a música, que se transformam em verdadeiras religiões cultuadoras da identidade branca, à medida que níveis crescentes de imigração para países ocidentais ocorrem provocando dificuldades no que concerne ao multiculturalismo e assimilação desses novos moradores. Esse ressurgimento é paralelo ao envelhecimento da primeira geração de líderes neonazistas do pós-guerra, aonde a lembrança do desafio do Eixo ao liberalismo ia ficando para a História.
Os desafios do multiculturalismo nos Estados Ocidentais são grandes, uma vez que esse está levando a uma hostilidade ainda mais difusa contra o liberalismo e entre grupos etnicamente diferentes. O exemplo das negativas ocorridas na Iugoslávia e na URSS, esses cultos arianos e o nazismo esotérico podem ser documentados como sintomas iniciais de grandes mudanças desestabilizadoras nas democracias ocidentais.

sábado, 7 de junho de 2008

Resenha do Livro: FRANK, Anne. O diário de Anne Frank. São Paulo, Record, 2003.

Anne Frank nasceu em 1929, na Alemanha, filha de um banqueiro e de uma dona de casa, ambos de origem judia. Aos quatro anos de idade, Anne foi obrigada a sair do país com sua família, encontrando inicialmente uma vida segura e confortável em Amsterdã, após a chegada de Adolf Hitler ao poder em 1933. Já em 1942, com a perseguição aos judeus deflagrada também na Holanda, após a tomada dos Países Baixos pelo III Reich, Otto Frank, sua mulher e filhas unem-se a mais quatro pessoas e decidem se esconder dos invasores alemães. Por mais de dois anos, até serem delatados, eles tiveram de viver dias aterrorizantes e toda a tensão da Segunda Guerra Mundial, limitados ao anexo do sótão do escritório de Otto Frank.
No esconderijo, o diário de Anne era o único instrumento de liberdade que ela possuía, e, nele, relatou a vida cotidiana do Anexo Secreto, as transformações sofridas por cada um dos que ali residiam e a angústia daqueles dias. Ele destaca sentimentos, aflições e pequenas alegrias de uma vida incomum, a transformações da menina em mulher, o despertar do amor, a fé inabalável na religião, e revela a rara nobreza de um espírito amadurecido pelo sofrimento. Quando encontrados, os moradores foram levados para uma prisão holandesa e posteriormente para um campo de triagem de judeus, Westerbork até serem transferidos para Auschwitz. Anne Frank fora em seguida transferida com sua irmã Margot, para o campo de concentração Bergen-Belsen, onde morreu de tifo, no inverno de 1945, aos quinze anos de idade.
A história começa em 12 de junho de 1942, quando a jovem Anne Frank ganha de presente de aniversário um diário. A partir desse dia a menina relata os seus sentimentos, pensamentos e tudo o que ela faz. Começa descrevendo sua vida bastante comum para uma garota de sua idade. Fala de suas amigas, da escola, dos seus pretendentes, família e passeios. A princípio nada de diferente para uma menina de treze anos, mas no decorrer de suas anotações percebemos uma preocupação em função do anti-semitismo que agora se fizera presente na Holanda e suas conseqüentes restrições, e com o planejamento de uma iminente fuga junto da família, o que faz seus pais se desfazerem de alguns móveis e objetos de valor para angariar fundos visando o incerto período que ficariam escondidos.
Quando sua irmã recebe uma notificação da SS a família resolve antecipar o plano de fuga. Com a ajuda de amigos, a família Frank reúne apenas alguns itens de mais necessidade e deixa a casa, de modo que não desconfiem que a família esteja fugindo. É nesse momento que Anne Frank deixa uma vida boa e confortável ao lado sua família para abrigar-se num esconderijo improvisado nos fundo do escritório de seu pai.
Quando chega ao Anexo a história torna-se ainda mais comovente. A difícil adaptação a uma vida de limitações e do difícil convívio com sua família e com outros quatro amigos judeus – os três van Daan como os chama, mas van Pels na verdade e o dentista Albert Dussel (Fritz Pfeffer) – também escondidos que resulta em constantes conflitos e discussões, estão muito presente em seus desabafos. No esconderijo todos vivem uma vida de abdicações de conforto e de privacidade com o inalterável medo de serem descobertos e delatados as autoridades nazistas e ou colaboracionistas holandeses, fazendo então silêncio, e tomando várias precauções para que isso não ocorra.
Os habitantes do Anexo Secreto, como Anne gosta de chamá-lo, necessitam da ajuda de alguns funcionários e amigos do escritório para o abastecimento de comida e para suprir a carência de algumas peças de vestuário, que ficavam numa situação degradante com o passar dos meses. São eles que arriscam suas vidas para levar alimentos e materiais higiênicos para os escondidos quando o estoque inicial vai acabando. Anne descreve o racionamento de comida pelo qual todos os holandeses passam, com a necessidade da utilização de talões para adquirir comida. Para eles evidentemente, é necessário que utilizem o mercado negro, através dos amigos do escritório Miep, Bep, Sr. Kugler e Sr. Kleiman, para consegui-los com constante elevação de preços. Difícil também era a preparação de comida, em função das restrições e escassez de certos itens, provocando uma grande falta de variedade e invariáveis repetições no cardápio.
Os piores momentos vividos eram os dos ataques aéreos a Amsterdã. Com o barulho das sirenes que o anunciavam os moradores ficavam apavorados, principalmente quando seguidos por tiros de armas e de canhões. Outra preocupação eram os assaltos realizados ao escritório e que conseqüentemente descobrissem o anexo, pois como Anne descreve muito bem em várias passagens, a sociedade viveu um período degradante de sua história, com famintos e desabrigados pelas ruas ao lado de delinqüentes que se aproveitavam da situação para roubar.
A jovem descreve toda a conjuntura da guerra com impressionante fidelidade. Com as notícias trazidas do mundo real pelos amigos ou ouvidas pelo rádio – este como o maior portador de notícias ao grupo e o elo de ligação deles com o mundo – descrevia as batalhas, as invasões, as tomadas de territórios pelos Aliados, as frustrações com o conflito com as baixas destes, a esperança com a resistência dos russos e as derrotas alemães. Marcante é o anseio desesperado pela invasão inglesa e o depósito de toda confiança e esperança nos neles como sendo aqueles que poderiam dar fim ao conflito e a perseguição aos judeus, ou seja, trazer de volta o passado fraterno. Isso é comprovado através de toda a alegria e o otimismo do “Dia D”, o desembarque inglês na costa da França e com o andamento dos russos para o oeste do continente.
Anne também deixa transparecer todo o seu lado humanitário, com a preocupação para com os outros judeus que não puderam se esconder e com os cidadãos holandeses, pelos quais tem grande apreço, e que também sofrem com a guerra. Relata os episódios comuns ao conflito, os quais já temos conhecimento, como as sabotagens, as resistências jovens e os trabalhos forçados aos quais os homens eram arregimentados, com toda a emoção e com o ponto de vista de uma vítima do conflito mundial. Anne também descreve seu desejo de tornar-se uma cidadã holandesa, já que sua nacionalidade alemã fora retirada por Hitler, mas tem medo diante da mudança de atitude dos holandeses para com os judeus, que segundo ela, o acolheram muito bem. A menina que deseja ter a Holanda como sua pátria, tem medo de ter que deixá-la após o conflito.
No lado pessoal, ela vive uma instabilidade comum a uma menina adolescente com seus típicos problemas de mentalidade, sociabilidade e sexualidade, tudo em profundas mudanças. É confusa quanto a seus sentimentos e assim fica com a descoberta do amor. Descobre em Peter van Daan– o filho dos amigos de seus pais que estão no esconderijo – uma pessoa que passa pelos mesmos problemas que ela e por ele sente uma mistura de amor, amizade, solidariedade, consolo e paixão, mas sem saber ao certo o que sente na verdade. Anne tem uma personalidade forte e difícil de lhe dar, tem crises temperamentais e existenciais, mas cresce, admite seus erros e seu temperamento difícil, e amadurece.
Ela tem saudades do passado, dos tempos anteriores a vida no esconderijo, tem o desejo de liberdade, de fazer as coisas como andar de bicicleta e de passear ao ar livre – a menina admira muito a natureza, o céu, a lua, a brisa sempre que pode – e de estar com amigos. Mas tem um forte apego na religião, coragem – não deixa de estudar como uma necessidade e como uma forma de passatempo –, perspectivas para o futuro e planos para o dia que saírem do esconderijo. No entanto, em alguns dias o otimismo e a esperança dão lugar à tristeza e ao pessimismo, e a menina chora sozinha em sua cama ou trancada no banheiro. Contudo, toda a expectativa da jovem menina foi em vão, pois sua vida foi abreviada antes de completar dezesseis anos de idade, num campo de concentração, pelos insanos planos do nazismo de Hitler.
O Diário de Anne Frank é mais do que um livro. É uma lição de vida, um relato emocionante de um dos períodos mais tristes e degradantes da história da humanidade. Com as palavras da jovem menina, o leitor vive junto de toda a população do anexo, toda a tensão e o andamento da Segunda Guerra Mundial através da visão das vítimas do conflito, que são completamente diferente das palavras escritas nos livros que abordam o assunto, pois são carregadas de emoção, sinceridade e principalmente, experiência. O diário mostra o caos e o estado de calamidade que a Europa viveu durante o conflito, com roubos, invasões, crises de abastecimento, racionamentos e mercado negro. Apresenta também todo o horror da perseguição e das atrocidades cometidas contra os judeus e toda a repulsa dessa gente a Adolf Hitler e a Alemanha, uma vez que seu sofrimento fora aumentando gradativamente à medida que Hitler adquiria mais poderes, não somente sobre a Alemanha, conforme sabemos através da fuga da família Frank de seu próprio país quando o führer chega ao poder, mas também quando ele se apodera de meia Europa.
Um documento que faz o leitor sofrer e torcer junto com os personagens e perceber o quão difícil foram àqueles tempos, e tamanhas foram às barbáries cometidas à humanidade por parte de uma pequena fração insana desse todo. Aclamado até os dias de hoje pela crítica, como um dos livros mais importantes do século XX, é uma obra antológica que deve ser lida por todos, para que a humanidade jamais se esqueça da brutalidade e da crueldade cometida e propagada pelo Nazismo e para que não permita que nenhum episódio semelhante tenha uma repetição na história e para que outros diários desse tipo não sejam mais escritos.

sábado, 31 de maio de 2008

Fichamento de Texto: KRAUSE-VILMAR, Dietfrid. “A negação dos assassinatos em massa do nacional-socialismo: desafios para a ciência e para a educação

1) A negação do Holocausto como tema de discussão:
Passado algum tempo, pouco mais de uma década, após o fim do segundo conflito mundial, a negação dos assassinatos em massa realizados pelo nacional-socialismo ganhou a cena, não somente nos estudos históricos e das demais ciências humanas e também as tecnológicas, mais também nos tribunais em grande parte da Europa e nos Estados Unidos.
A negação pública dos crimes nazistas, que mais tarde foi chamada de Revisionismo – por seus adeptos pretenderem, segundo eles próprios, revisar a história – iniciou por essa vertente não negando que tivesse ocorrido a matança em massa por uso de gás tóxico ou asfixiante, a princípio, apenas relativizando as declarações das testemunhas da época, relativização essa que, seria passagens fluidas para as negações desses eventos.
No entanto, com o passar dos anos, as negações tornaram-se cada vez mais abrangentes e irracionais e simplesmente, inegáveis. Por isso, segundo o autor “devemos nos ocupar da negação dos assassinatos em massa, pelo fato de que a monstruosidade dos crimes nazistas impõe-nos compromissos permanentes”. (p.1 §1)
Alegações como que a situação que reinava nos campos de concentração, não era de responsabilidade dos membros da SS, mas sim, primordialmente pelos prisioneiros que por ela haviam sido nomeados pela administração dos campos e pela vida dos demais prisioneiros, começaram a surgir a partir dos revisionistas. Esses mesmos negavam outros pontos bastante comprovados pela historiografia mundial como o número de pessoas assassinadas, as técnicas usadas no extermínio, os documentos e figuras históricas que foram apresentados, os locais dos campos de morte e a existência das câmaras de gás.
Declarações como o questionável relatório Leuchter (documento baseado em amostras de pedras e rochas retiradas de Auschwitz que tentou negar a ocorrência de assassinatos nas câmaras de gás) surgiram, sendo bravamente refutadas. Essas declarações provocam grande impacto na opinião pública e ganham espaços nas mídias sensacionalistas, por isso, muitos negadores desses crimes foram levados a condenações.
O cerne das afirmações dos revisionistas consiste na negação do assassinato em massa dos judeus europeus. Questiona-se também a culpa dos alemães pela guerra e a dimensão dos crimes cometidos por eles, afirmando também que a II Guerra Mundial teria sido imposta aos alemães a partir de fora.
Muitas declarações dos revisionistas não negam totalmente tais eventos, e sim, desdenham e diminuem um determinado acontecimento, possibilitando relativizá-los e dessa forma não negar a história. Alguns exemplos: o aumento indiscriminado do número de vítimas alemães; a perseguição aos judeus como medidas de anti-espionagem e anti-guerrilha numa situação de guerra; afirmação de que os líderes nazistas desconheciam o extermínio dos judeus e que esses exageravam o ocorrido em busca de reparações financeiras, sendo também pertencentes a uma conspiração judaica mundial (percebemos o caráter anti-semita nas declarações a ainda aquele estereótipo do judeu ávido por dinheiro).

2) Os níveis de argumentação dos negadores de Auschwitz:
O revisionismo é marcado pela complexidade para desvendar algumas declarações e discrepâncias nessa atividade, onde encontramos lendas e invenções facilmente refutáveis ao lado posicionamentos críticos e de aspectos específicos que demandam conhecimento para rejeitá-los. Essa atividade tornou-se uma enorme rede internacional contando com inúmeras publicações, realização de conferencias e intensiva utilização da internet pra disseminá-las.
Os revisionistas também promovem uma inversão daqueles que são possidentes da verdade, alegando que os testemunhos dos criminosos teriam sido obtidos sob tortura e outras formas de extorsão, considerando-os sem valor, enquanto os perseguidos aparecem como mentirosos e criadores de fantasias e exageros.
Esses estudiosos alegam a suposta existência de uma declaração de guerra judaica feita antes da II Guerra, insinuando que a Alemanha teria sido vítima e não autora dos crimes. Todas essas declarações são apresentadas por eles com bases empíricas, no entanto, são utilizados documentos sem garantias de conteúdo autentico, sendo feita uma descontextualização de documentos e alguns fatos históricos, excluindo deste material, o conteúdo histórico-político documentado de maneira correta. Eles transformam documentos isolados em documentos-chave ou transformam afirmações de testemunhas, algumas vezes contestáveis, em relatos-chave, afirmando que declarações dos oficiais da SS teriam sido obtidas mediante extorsão, e a de prisioneiros como desqualificadas como sendo inteiramente não confiáveis, modificando os possuidores da verdade. São capazes também de desconsiderar os diários e as declarações dos líderes nazistas que descreviam o extermínio detalhadamente.
A fonte material de que dispõem deve ser descrita como escassa ou estreita – vários deles compartilham mesmos textos-base, muitas vezes literaturas exclusivamente anti-semita e sem importância histórica. São claramente conotadas de motivos anti-semitas com uma linguagem marcada pelo ódio e pelo desprezo com um nível lingüístico de argumentação dessas pessoas compostas muitas vezes de frases e expressões de origem anti-semita caracterizadas pelo ódio, não sendo eruditas e sóbrias, e sim desapropriadas a um discurso que busque um distanciamento analítico.
O foco das afirmações dos negacionsitas é o campo de concentração de Auschwitz, no entanto outros são tematizados como de passagem e sistematicamente negados tais como: a perseguição aos judeus antes do início da guerra; os homicídios através da eutanásia; o tratamento dispensado aos prisioneiros de guerra, principalmente os soviéticos (o horror dos campos de concentração); os assassinatos em massa praticados em outros campos de extermínio; e o assassinato de outros grupos de prisioneiros como os ciganos, os homossexuais, prisioneiros políticos e testemunhas de Jeová.

3) O problema das fontes históricas disponíveis:
Essa vertente de estudiosos continuam a negar tais eventos mesmo diante de provas inegáveis. Além dos relatos das testemunhas diretas, existem, em correspondências da SS e em outras fontes preservadas, evidências suficientes do assassinato em massa provocado por gás asfixiante, mesmo sem esquecer que próximo ao final da guerra, a SS, deslocou efetivos para apagar os vestígios das atrocidades cometidas por eles. Algumas dessas fontes são as fichas de trabalho de trabalhadores civis em Auschwitz, que informam sobre os serviços de manutenção e reparos nas câmaras de gás; a visível capacidade dos enormes crematórios e os relatos feitos por prisioneiros que fugiram de Auschwitz durante a guerra. Com isso, a afirmação dos revisionistas, segundo as quais as informações sobre os assassinatos em massa seriam invenções fabricadas no pós-guerra, ficam refutadas, sem sombra de dúvidas.
É uma obrigação de todo o ser humano jamais deixar que tais crimes contra a humanidades sejam esquecidos e tampouco contrapostos de forma tão grosseira, de modo que o esquecimento e a negação dessa monstruosidade tornam-se um passaporte para novas cadeias de eventos do mesmo caráter, conforme podemos perceber nos últimos anos, ainda, felizmente, longe da magnitude dos horrores praticados durante a II Grande Guerra.

Resenha do Filme "Triunfo da Vontade"

O filme da diretora Leni Riefenstahl, foi encomendado por Adolf Hitler que buscava filmar de um modo mais profissional seus eventos oficiais do Partido Nazista. O filme se destaca pela sua qualidade técnica – tendo em vista que foi filmado no ano de 1934 – contando com uma imagem de alta qualidade, sonoridade perfeita para a época em que fora realizado e com fotografias fascinantes. Tudo isso comprova todas as pesquisas e o desenvolvimento técnico alcançado pelos alemães durante o período nazista, atestando que o empenho as novas e inovadoras tecnologias não se restringiam ao belicismo, além da utilização dos nazistas pelo cinema para divulgar suas ideologias, suas ações.
Como a simplicidade não estava presente nos sonhos e tampouco no governo de Hitler, nada melhor do que fazer um filme para mostrar com toda a grandeza do cinema toda a movimentação do regime nazista. O longa-metragem começa já com um gigantesco desfile de Hitler pelas ruas da Alemanha, quando é ovacionado pelas pessoas nas ruas que acompanham eufóricas a parada. Já com essas primeiras cenas já se percebe a grandiosidade das manifestações organizadas pelo Partido Nazista e que muitos outros exemplos ainda estariam por vir no filme.
Outro detalhe que logo desperta a atenção do espectador é a perfeita musicalidade das cenas, que substituem as falas dos “personagens”, e dão mais ênfase aos discursos, os únicos momentos do filme em que se ouve a voz de alguém.
Numa das primeiras cenas do filme em que mostra atividades ao ar livre, no campo de jovens alemães, provavelmente da Juventude Hitlerista, já percebemos características próprias do regime nazista, como o movimento de resgate de valores da natureza, da vida campestre, assim como o do culto ao corpo, da educação física, e de humanidade entre os alemães – evidente os arianos – já com o intuito de formação de valores de companheirismo, de confiança de um em outro, do trabalho em equipe, tudo isso através de brincadeiras, gincanas e atividades que podem ser vistas por um leigo como meras atividades de recreação para jovens, mas já era a formação de soldados do Exército Nazista já introduzido com seus valores destacados mais acima.
Também são destaque no filme os congressos do Partido Nazista, onde estavam presentes além de militares e de membros de outros partidos alemães, presidentes de outras nações da Europa, ou seja, mais uma evidencia do prestígio e respeito que Hitler tinha dentro seu país e do consentimento dos países europeus para com sua política, sem contar com a presença maciça do povo alemão.
No congresso Nacional-Socialista alemão de 1934, os membros do partido já discursavam para os presentes os objetivos do III Reich, como a formação da Grande Alemanha, justificativa de que uma revolução seria necessária para que a nação se tornasse vitoriosa, ressaltou-se também o crescimento industrial e econômico pelo qual vinha passando a Alemanha (num claro discurso de um dos integrantes que afirmara que Hitler “havia tirado o país do buraco”) e já a valorização da pureza racial para que o Reich fosse vitorioso e subjugasse as nações da Europa Oriental. Tudo isso, mais uma vez destacando, com a presença de líderes de nações vizinhas. Com toda a aclamação da população aos objetivos de Hitler, este é de fato, sacralizado.
Hitler foi uma figura que inaugurou o terreno da política de massas, encenando todas as suas aparições públicas de orador do partido como se fosse à entrada de um célebre tenor nos palcos de um teatro, com toda a sua inspiração wagneriana. Todos os seus monumentais discursos para uma enorme platéia eram verdadeiros espetáculos encenados que tocavam a população fazendo-a sentir orgulho de sua pátria e de pertencê-la. Eram comícios hipnóticos e teatralizados onde o füher era o ator principal.
Ele discursava para todos, trabalhadores, jovens, para a sociedade em geral. Para os trabalhadores, alinhados de uma forma semelhante a doutrina militar, pregava a igualdade dos valores de trabalho, não propondo mais uma divisão e sim uma união de finalidades, num claro desconhecimento de castas e classes, cobrando sempre a dedicação. Para os jovens reverenciava aos que haviam morrido pela Alemanha e os ensinava a serem duros e corajosos e que aceitassem as privações em nome de uma pátria forte, de uma Alemanha viva. Era uma forma completamente inovadora de política, sem intermediários entre o líder e a sociedade, permitindo um acesso direto.
Nas grandes produções destacamos os eventos realizados a noite, iluminados pelo fogo que denotava um misticismo. Havia também a valorização da cavalaria como um apego nazista as tradições medievais, reafirmadas para a escolha de Nuremberg, uma cidade medieval, para sede de seu partido e não uma cidade já industrializada como Berlim.
A perfeita sincronia dos desfiles militares, onde marchavam todos completamente alinhados, revelam o ideal de defesa e todo o senso de ordem e coesão não somente para as forças armadas, mas para toda a nação.
O filme condensa todos os valores propagados e destacados pelo nazismo, intrínseco a propaganda, o doutrinamento ideológico, a visão estética subjacente na paranóia por marchas e continências, o ideal de ordem e coesão. É um filme que mostra também a receptividade e a fidelidade da sociedade aos apelos e a política de Hitler, demonstrados logo no início do longa-metragem através das bandeiras do Partido Nacional Socialista penduradas pela cidade.
É com certeza um filme exaustivo, mas que merece ser assistido, evidente não como um entretenimento, e sim como uma forma de análise e estudo de um dos períodos de maior complexidade da história da humanidade.

Ficha Técnica
Título Original: Triumph des Willens (Triunfo da Vontade)
País de Origem: Alemanha
Ano: 1934
Duração: 110 minutos
Diretor: Leni Riefenstahl

Resenha do Filme "Arquitetura da Destruição"

O filme “Arquitetura da Destruição” do diretor sueco Peter Cohen é ao mesmo tempo chocante e esclarecedor, sendo sem dúvida, a visão de uma pessoa que tem bastante conhecimento e pesquisa sobre o assunto. O longa-metragem tem como pano de fundo de toda a megalomania de Hitler seu irracional desejo de embelezar o mundo, evidente que começando e priorizando o III Reich e expandindo pros territórios que fosse conquistando.
Como Peter Cohen deixa bem claro, é importante destacar que não se trata de um embelezamento superficial, que só contasse com imponentes construções arquitetônicas. O processo era mais longo e mais fundo, desde as artes em geral até a tentativa de uma saúde perfeita e de uma estética irreparável para o povo alemão, incluindo, evidente, o extermínio de judeus.
Hitler e demais membros do governo nazista tinham um grande apreço pela arte, sendo o füher, inclusive um pintor frustrado, algumas de suas gravuras seriam aproveitadas como modelo de projetos arquitetônicos. Sendo a Alemanha um país de homens que aspiravam servir as artes, havia inúmeras manifestações artísticas, como o Dia da Arte e uma instituição de defesa da arte alemã. Hitler fazia questão de anualmente realizar exposições de arte genuinamente alemã, mesmo nos conturbados anos de guerra, onde comprava centenas de obras.
Os discursos de Hitler são um dos exemplos da característica artística de seu governo. Eram a máxima expressão da teatralização, verdadeiros espetáculos encenados, numa visão de que o “comício como o mito do corpo do povo”, era um grande show coreografado com Hitler atuando como diretor, coreógrafo e ator principal, que sem se descuidar de nenhum detalhe, levava a as massas à histeria coletiva a cada frase discursada. Ele transcendia a idéia de política tradicional Hitler abominava as artes modernas, como as vanguardas européias futuristas e dadaístas. Gostava de chamá-las de arte degenerada, associando-as aos bolcheviques e que dizendo que eram instigadas pelos judeus. Ele chegava a realizar exposições de “arte degenerada” paralela as grandes exposições de arte genuinamente alemã, para que a sociedade pudesse compará-las e perceber superioridade da última. Tamanho era o desprezo pela arte moderna que Hitler comparava-a com as deformidades físicas das pessoas.
Era comum a esterilização de doentes físicos e mentais, que eram vistos como indivíduos inferiores a qualquer animal, para que esses não passassem suas “deficiências” hereditariamente para os descendentes, num grande receio de que a população de doentes ultrapassasse a população saudável da Alemanha.
No regime nazista a eutanásia ganha um novo significado, perfeitamente compreendido no filme, e é praticada como arte, ao eliminar o feio e o disforme. Há o crescimento do número de médicos e de cursos de medicina nazista e esta realiza vários progressos, ficando entre as melhores do mundo, com o médico no ambíguo papel de salvar vidas e sentenciar a morte. Para que a Alemanha ficasse livre de deficientes eram feitos testes e extermínios em outros territórios, como a Polônia.
Não se podia deixar a raça sucumbir aos adventos da vida moderna, dizia Hitler. Por isso a saúde era vista como o princípio da beleza, ou seja, os problemas estéticos são também considerados como de saúde. Destaque para a criação do Museu da Vida, onde o médico é o mediador entre a beleza e a saúde.
Como o embelezamento era vinculado diretamente à limpeza, a limpeza do local de trabalho e a limpeza do próprio trabalhador eram imprecindíveis. Sempre com o lema “trabalhadores limpos em lojas limpas”, era uma adequação entre funcionalidade e beleza nas empresas. Dessa forma os nazistas consideravamm que ao garantir ao trabalhador a saúde e a limpeza, libertavam-no de sua condição proletária e, garantiam-lhe dignidade de burguês, eliminando portanto a luta de classes.
É impossível falar do imaginário artístico de Hitler que beirava a loucura sem citar Albert Speer. Seu fiel e oficial arquiteto era o responsável de tornar real todos os megalomaníacos sonhos artísticos. Com ele surgem novos prédios e avenidas para caracterizar o período, e muitos outros não chegaram a sair do papel em virtude do conflito mundial e dos rumos que ele foi tomando.
Eram construções monumetais que desafiavam a física e que superariam em muito todos as criações arquitetônicas até então existentes e que lhe servira de inspiração, como a cúpula da Basílica de São Pedro e o Arco de Truinfo. Ainda incluiam nos planos reformuladores de Hitler, a construção de uma nova Berlim, que seria a capital não só do III Reich, mas também do mundo, e deixaria Paris as suas sombras, baseada num regresso ao belo e até mesmo a superação deste para ultrapassar os desafios do moderno.
O filme apresenta ainda que Hitler tinha uma enorme adimiração e uma fixação irrestrita a antiguidade como um modelo e visionário, inclusive sugerindo que os germânicos teriam os gregos como antepassados. O mundo grego e suas artes eram vistos como o belo, o perfeito e o almejável. Em função de tanta admiração, em 1941, quando a Alemanha invade a Grécia, o füher impede que Atenas seja bombardeada, resguardando dessa forma sua cidade referencial. É também um apreciador de Esparta considerando-a como a nação mais pura e via Roma como o Império mais poderoso.
A política estética de Hitler não podia esquivar-se dos judeus, segmento em que o filme dedica um bom tempo com a perseguição e eliminação dos judeus como parte do processo de purificação, não só da raça, mas de toda a cultura, mostrando o processo de extermínio. Esses eram aludidos a bactérias, tendo que fazer com os judeus o mesmo que se faz com elas, exterminá-los, dando continuidade aos trabalhos de Koch e Pasteur. Esse povo era comparado a um câncer que se alastra.
A propaganda nazista, com os filmes exibidos nesse período funcionando como importante veiculação das ideologias e loucuras nazistas disseminava o ódio para com os judeus como pragas a serem exterminadas como uma questão higiênica, de saúde pública, da mesma forma que os insetos eram eliminados, através dos inseticidas (criados na época e utilizados nas câmaras de extermínio). O genocídio dessa forma atingiria um modo mais higiênico, gentil e delicado que os fuzilamentos.
Conforme o longa-metragem mostra, fora feito um saneamento antropológico em nome da beleza, da estética e da pureza, encontrando os planos de Hitler, para seu maior desempenho e para o horror para a humanidade, pelo caminho as câmaras de gás. A estética, cuja valorização é importante lembrar que estava presente nos padrões culturais europeus, também é vista como a força motora do Nazismo, dentro do seu ideal de embelezamento do mundo, nem que para pô-lo em prática, antes tivesse que antes destruí-lo. E foi isso que Hitler começou a fazer.
Ficha Técnica:
Título Original:
Arquitetura da Destruição
País de Origem: Suécia, 1992
Duração: 121 minutos
Diretor: Peter Cohen
Narração: Bruno Ganz

Fichamento de Texto: VIZENTINI, Paulo F. “O ressurgimento da extrema direita e do neonazismo: a dimensão histórica e conceitual”

Introdução:
O neonazismo não se restringe à idéia de um movimento político em si, ou a questões exclusivamente de origens sociais, éticas ou filosóficas. Trata-se de um fenômeno que está calcado nos problemas internacionais e que não está conhecendo fronteiras no mundo inteiro. Apresenta-se em diversas formas, seja como partido político, no caso de extrema-direita, de um eleitorado suprapartidário e como gangs sendo o que se chama de um processo múltiplo, e o que é visível representa apenas parte de um fenômeno muito mais complexo.

Nascimento, expansão, derrota e hibernação:
Houve na Europa um solo fértil para o surgimento do nazifascismo, no fim da I Grande Guerra como o sucesso da Revolução Bolchevique e as crises financeiras que atingiram o continente e ainda estava em cena um processo de negação de todo ideário da Revolução Francesa, resgatando tradições conservadoras que se opunham a noção de progresso e a noção iluminista.
Recentemente foi feita uma comparação muito interessante entre os anos 70 e 80 com os anos 20 e 30 mostrando o tipo de produção cultural e de imaginário político que foi se gestando, os desgastes sofridos pela economia e pela política, sobretudo na Europa, mas não limitado a ela, e que tiveram como respostas manifestações sociais de forma a repudiá-los.
O ressurgimento dessas ideologias deve-se ao fato de que em 1945, o fascismo foi derrotado, mas não eliminado ou vencido definitivamente, pois ainda, no final da Segunda Guerra Mundial regimes de perfis fascistas estiveram presentes na cena política na Europa. Portugal de Salazar e a Espanha de Franco negociaram com as potências vencedoras e mantiveram-se no poder. Evidente que algumas reformas um pouco cosméticas foram introduzidas nesses regimes para mascarar o seu caráter, pois o nazifascismo fora derrotado, e eles permaneceram no poder até a década de 70, inclusive participando da OTAN. Destaque também regime dos coronéis gregos durante os anos 60 e 70.
Houve uma tentativa durante e após a guerra de esmagar junto com o fascismo, as ideologias esquerdistas, o que não conseguiram as potências ocidentais. No entanto, na Guerra Fria foi feita uma divisão da Europa de caráter geopolítico, não respeitando as particularidades internas dos países na hora de estabelecer as divisões. Na realidade, países como a Grécia, a Itália e a França, onde a esquerda era muito forte, permaneceram no campo ocidental. Enquanto isso, países onde a esquerda era muito fraca, como Polônia, Hungria e Romênia, permaneceram no bloco soviético.
Uma das saídas encontradas foi reorganizar as forças conservadoras, nos países do lado pró-ocidente, em tomo, por exemplo, de partidos como a Democracia Cristã, de centro e centro-direita que deveriam, então, equilibrar a vida política desses países. Há de se ressaltar que dentro dos partidos de centro-direita formados no pós-guerra havia militantes e membros dos partidos fascistas.
Com o Plano Marshall, percebe-se uma nova tendência nos julgamentos de criminosos de guerra, inocentando pessoas, sobretudo grandes empresários que haviam sido extremamente ativos na manutenção desses regimes. O anti-comunismo vai ser a grande bandeira atrás da qual puderam se esconder, mostrando uma forma de solidariedade com as democracias liberais que ali existiam, falando da ditadura dos outros (o leste socialista) e não daquela do seu passado, com a afirmação de que o problema estava do outro lado da Cortina de Ferro, exclusivamente, essa foi uma camuflagem muito útil para a manutenção da vida política nesses lugares, para quebrar o poder da resistência e dos grandes partidos de esquerda e dos sindicatos, que eram extremamente fortes em vários desses países.
No entanto, personalidades nazistas eram extremamente úteis no Pós-Guerra, como os especializados em combater as organizações de esquerda e que trabalharam por um tempo para a agência de Inteligência norte-americana (CIA), sendo o caso, de Wemer Von Braun. Outros utilizaram seu conhecimento técnico importante para o projeto espacial norte-americano e, evidentemente, tiveram seus arquivos suavizados para poder participar como um cidadão das democracias em uma corrida espacial contra a URSS.
Formou-se de fato, uma série de redes internacionais de solidariedade que levaram várias personalidades, elementos importantes do regime derrotado, a buscar refúgio tanto nos EUA quanto no Canadá, mas também nas periferias como a América do Sul e África do Sul, sendo elementos integrados como uma força anticomunista. Nesse quadro, destaco a operação Gladio, uma organização paramilitar, que assim como outras, eram utilizadas como uma virtual segunda linha de defesa da OTAN, no caso de uma guerra e de uma invasão soviética. Como ela nunca aconteceu, elas eram empregadas para golpear organizações sociais, organizações civis de esquerda, sindicatos, partidos políticos, entre outros. A organização Gladio era uma formação européia, existente em todos os países da Europa e financiada pela OTAN durante todo o período de Guerra Fria.
Durante os "anos dourados" nas sociedades ocidentais, particularmente na Europa, a população sofreu uma acomodação política. Houve uma desnazificação conduzida pelos governos, com políticas educacionais específicas dirigidas aos estudantes e toda a geração que se seguiu à Guerra, existindo um enquadramento desses em uma sociedade liberal democrática, uma sociedade de consumo, ocorrendo progressivamente, uma despolitização dessas populações, onde o remexer no passado procurando investigar, acabava por chocar-se com o passado dos seus pais.
Nesta época, os partidos de extrema-direita tinham uma composição etária curiosa. Eram formados por pessoas acima de 60 anos e que haviam sido nazistas no passado; e depois se seguia a faixa de pessoas de meia idade, onde a pirâmide reduzia-se drasticamente; abaixo, uma ampla base social de jovens, assim, aquelas pessoas que haviam vivido a desnazificação tinham uma representação muito pequena. Normalmente esses partidos viviam uma vida vegetativa e semi-clandestina, onde outras formas de reuniões eram preferidas, como os clubes e associações e que utilizavam certas causas periféricas, por exemplo, as mudanças de fronteiras.

O ressurgimento da extrema direita e do neonazismo:
Os grandes "anos dourados", os anos de prosperidade, começam a esgotar-se desde a crise do petróleo. Em meados da década de 70, o mundo inteiro é sacudido por diversas revoluções ultranacionalistas ou socialistas, que atingem o Terceiro Mundo, da Nicarágua a Angola, do Ira ao Vietnã. A crise do petróleo desencadeada por regimes do Oriente Médio no poder criou uma recessão econômica que começava a atingir o Primeiro Mundo. Era também o fim do milagre econômico da Era de Ouro e do Estado de Bem-Estar Social. Na verdade, por trás disso, está uma reconversão industrial e tecnológica muito mais ampla (a crise do petróleo é um problema limitado dentro de um amplo espectro de reorganização produtiva). De qualquer forma, a crise econômica e a vitória dessas revoluções começam a fazer com que aquela simpatia que existia na classe média européia pelo Terceiro Mundo - e que muitas vezes era uma espécie de "alívio da consciência de seu próprio passado" - passasse a declinar.
Com o surgimento de alguns capitalismos bem sucedidos no Terceiro Mundo os países ocidentais começam, lentamente, a ser inundados por mercadorias baratas produzidas na Ásia Oriental, por exemplo, que criaram certo tipo de xenofobia, pois passam a competir com países do Primeiro Mundo. Há claro, um quadro de estagnação industrial, e o surgimento do desemprego, tudo isso aumentado pela enxurrada de imigrantes.
Esses fatores favorecem o renascimento do nazifascismo, e somado a isso, está à estagnação e a regressão demográfica dos países do Hemisfério Norte. O problema demográfico em si mesmo, era acrescido a reorganização da economia mundial, que fazia com que alguns setores econômicos do Primeiro Mundo necessitassem de um tipo de mão-de-obra mais barata e fizesse, efetivamente, um apelo a vinda de trabalhadores estrangeiros para setores que não tinham a margem de lucratividade suficiente para atrair a população nativa mesmo desempregada, esses além de crescerem profissionalmente, constituem famílias e acirram a competição no mercado de trabalho e por serviços básicos.
Nesse período, a sociedade de consumo formada era ligada a uma idéia de cidadania enquanto consumo, surgindo contrários a esse estilo de vida, os hippies "cabeludos e pacifistas" (e de classe média), que vão ser substituídos por uma versão mais popular, os skinheads. Eram movimentos de contracultura pelo desencanto com a sociedade de consumo, com a sociedade que se centrava na questão do indivíduo e do enriquecimento pessoal. Esse vai ser então, um local de recrutamento para as organizações fascistas ou neofascistas.
Nos anos 70, os regimes de Salazar em Portugal, o franquismo na Espanha e o regime dos coronéis gregos vão desmoronar, e a extrema direita começa a reorganizar-se abertamente com o fim “oficial” de regimes semelhantes ao fascismo. Os anos 80 são anos de retomada do liberalismo na economia. É uma época que vai caracterizar-se pelo desemprego e por incertezas de toda ordem, o emprego passa a ser uma virtualidade ou passam a ser frágeis, sem seguro social. A forma de trabalho passa a ser flexível devido ao toyotismo que, então, substitui o fordismo. Tudo isso refletido não só pelos skinheads, mas também pelas torcidas organizadas, os hooligans, que estão fortemente implantados nos bairros de desempregados e de classes deprimidas.
Estas tensões sociais vão encontrar uma válvula de escape na xenofobia e no racismo, que foi seu grande ponto de partida e o seu relançamento. Os estrangeiros passam a significar, nesse sentido, pessoas que iriam tomar seus empregos, que estariam mudando seus modos de vida e de sua cultura, introduzindo as drogas, a criminalidade, a decadência. Crescem os pedidos para rever a política de imigração para refugiados políticos, que havia sido uma "generosidade" da Europa até aquele momento, muito motivada pelo passado nazista. Tamanha é a demanda do povo por restrições às imigrações, atendidas pela direita, que a esquerda passa a fazer o mesmo. Todo o espectro político começa a caminhar para a direita, nos anos 80, com a eleição generalizada de governos conservadores na Europa, paralelo e estimulado pela falência do projeto social-democrático e pela crise do socialismo na década de 80, acrescido pelas privatizações e cortes de serviço social.
A partir disso, a social-democracia que deu estabilidade à Europa no Pós-Guerra, começa a passar por toda uma reciclagem para tentar aproximar-se de uma visão mais à direita. O ressurgimento da Guerra Fria permitiu o retomo da ideologia enaltecedora da violência e o combate a elementos reformistas e esquerdistas.
Contudo, as potências acabaram criando um "monstro" que, retoma-se o culto ao militarismo. Nos anos 80, vários problemas vão levar ao retomo do irracionalismo, refletido no campo das ciências, aquilo que futuramente chamar-se-ia de pós-modernidade. O pensamento de que o mundo é inexplicável, contraditório amplia-se para o campo da cultura, da sociedade, da religião, ou seja, há uma ampla expansão desse irracionalismo. Ocorrem peregrinações que aumentaram pelo mundo. O Estado está se retirando do campo social e econômico e os grandes movimentos políticos e os partidos não respondem mais as demandas sociais. A necessidade de buscar proteção toma-se imperativa.
Todo esse misticismo torna-se um fenômeno de massa, com a emergência de jogos de sorte e azar, loterias e horóscopo, as pessoas começam a gostar de assistir filmes, não apenas de violência, mas aqueles filmes que propõem um tipo de catarse. Formas atávicas, como a restauração de um Islã, reintroduzindo práticas sociais arcaicas e, finalmente, tomando-se um regime político a religião toma-se uma política de Estado. A religião passa a ser uma categoria política.
O fim da URSS e da Guerra Fria, a competição econômica internacional e a reestruturação tecnológica, produzem não só integrações econômicas, mas fragmentações pelo mundo, gerando uma crise social e econômica de novo tipo, onde a esquerda reclama menos da exploração e mais da exclusão. Ou seja, muitas vezes os governos de esquerda fazem enormes concessões para atrair alguma empresa, mantê-la e para ter algum ingresso de capital.
Passa a existir uma espécie de extrema-direita, sem causa e abandonada. O fundamentalismo islâmico, por sua vez, escapa do controle. Os neonazistas começam a fazer ações, principalmente nos países do Leste Europeu, que saem do regime socialista. A extrema-direita, o nacionalismo, a xenofobia e as idéias neonazistas surgem com vigor em países onde até então não havia, de certa forma, estruturas e formas de convivência capazes de lidar com este fenômeno.
Os últimos anos do comunismo foram negativos em termos de performance econômica, havendo uma descrença neste sistema por uma parcela significativa da população. Além disso, a idéia geral era "passar para o outro lado". Ora, adotar outro sistema revelou-se uma experiência frustrante e dolorosa, porque implicou em uma reciclagem industrial e numa política de ajustes que ocasionou forte desemprego. Daí o desencanto com o capitalismo ter sido um passo muito rápido, porque quanto mais ilusão se tem com algo, mais rapidamente vem à desilusão, deu-se o resgate de formas atávicas do que havia de pior no nacionalismo desses países.
Houve um grau de despolitização inédito. O desencanto das pessoas com os partidos, com os políticos e com as instituições democráticas é elevado e extremamente preocupante, abrindo espaço para "antipolíticos" populistas. Quanto a não aceitação do outro, do diferente, eram atestado quando as pessoas chegadas do Leste Europeu e que ficam acampadas próximos das estações ferroviárias, quando jovens neonazistas são pagos por pessoas vizinhas para expulsá-los dali, numa tentativa de continuar a tranqüilidade. A queda do Leste Europeu ampliou em muito o problema das migrações, onde uma massa de refugiados, se dizendo perseguidos políticos ou de origem alemã, ou ainda fugindo de guerras, chega à Europa Ocidental diariamente, as vítimas são apresentadas como agressores e delinqüentes.
Outro caso é o "racismo" existente entre os wessis e os ossis, ou seja, os alemães da Alemanha ocidental e os da antiga Alemanha oriental. Existe um sentimento de rejeição recíproca muito forte atualmente, pois as duas sociedades são estruturalmente diferentes, e os orientais são tratados como vencidos. Trata-se de questões socioeconômicas e políticas, inclusive no barril de pólvoras da lugoslávia, pois sérvios, croatas, bósnios e eslovenos constituem um mesmo grupo étnico.
Como resultados, os neofascistas estão presentes nas últimas eleições. No entanto sabe-se que o medo e a ignorância são à base desses movimentos, e as democracias devem se armar contra isso, através da mobilização social.
Estamos vivendo uma espécie de esgotamento, declínio e em alguns pontos, até colapso de uma ordem que existiu anteriormente. É precisamente neste hiato de pânico e desesperança que surge o medo. Já se expandiram através do mundo as revoluções conservadoras e os diversos fundamentalismos. O contra-senso nutre-se de ignorância e medo, de crença e esperança. São os elementos de toda religião, de toda superstição. O traumatismo econômico que sofrem atualmente as sociedades arrisca transformar esses elementos em elixires para uma nova barbárie.